Construindo as Empresas do Futuro - Comunicação e Gestão do Diálogo Colaborativo

Por Dado Salem
Agosto 2022


Estamos vivendo uma grande revolução. Vemos um sistema em declínio e outro emergindo. Nessa palestra no IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), em julho de 2022, apresentei um apanhado histórico mostrando as principais revoluções que a humanidade passou e a que estamos vivenciando hoje. Com esse rápido exercício, relembramos de onde viemos, em que ponto estamos e percebemos com mais clareza para onde estamos indo. Apresento um quadro com os principais valores do Sociedade Industrial e da Sociedade em Rede. Isso pode trazer mais clareza para empreendedores de startups e para aqueles que administram empresas criadas com a cultura que está em declínio (e não querem ficar para trás), como deveriam estruturar suas organizações. Concluo demonstrando quanto a Comunicação e as habilidades de diálogo são fundamentais daqui em diante. 



                Cibernética, Macy Conferences, NY 1946 a 1953

Gostaria de agradecer ao IPT e ao IEL (Instituto Euvaldo Lodi) pelo convite. Estou aqui com meu querido amigo e parceiro Celso Alvim (Maestro do Monobloco) que vai conduzir depois da minha apresentação um exercício de comunicação. Eu vou sentir que atingi meu objetivo se no final da minha apresentação e do exercício junto com o Celso, vocês tiverem certeza de que a Comunicação é a coisa mais importante que vamos precisar aprender e desenvolver neste momento e daqui para frente. É a Comunicação que vai mandar e a minha palestra vai justamente mostrar por que isso está acontecendo. 

Eu nomeei essa apresentação Construindo as Empresas do Futuro, porque inovação é tudo o que estamos conversando aqui, e no subtítulo Comunicação e Gestão do Diálogo Colaborativo, vocês vêem que as palavras Comunicação e Diálogo se repetem justamente para reforçar importância disso. Vou apresentar a vocês um Contexto, mostrar um pouco do meu entendimento sobre o que está acontecendo hoje, mas contando uma história, lá de trás, até o aumento atual. 

 

O presidente do Google falou em 2021 (matéria do The Times) que a inteligência artificial vai ter um impacto maior do que o fogo para a humanidade. Isso mostra que estamos vivendo uma grande revolução, porque sabemos a importância que o fogo teve para nós. Se uma pessoa dessa importância está falando isso, acho bom prestarmos atenção.

 

Muitos dizem que estamos vivendo a quarta Revolução Industrial. Eu acho que essa denominação não é a mais apropriada perante o tamanho da transformação que estamos passando. Eu vou explicar por quê. 

 

Então, quais foram as grandes revoluções que a humanidade vivenciou? Começamos em Sociedades Tribais. Fazíamos parte de povos nômades, vivíamos numa íntima conexão com a com a natureza. Vemos os povos indígenas aqui no Brasil que continuam com esse estilo de vida e na África também. Para eles a coisa mais importante é a Natureza. Respeitam e reverenciam a Natureza como uma coisa sagrada. Eles são os primeiros pensadores sistêmicos, entendem exatamente como funciona todo o ecossistema. Para eles a Natureza é uma grande mãe, porque tudo o que precisam a Natureza provém. Nós que estamos bastante afastados Natureza temos um pouco de medo dela. Na nossa narrativa, muitas vezes a Natureza é um lugar hostil de onde saímos fugindo dos leões na Floresta e conseguimos construir uma civilização. Hoje nos sentimos mais tranquilos e seguros. Mas se você for conversar com um indígena você vai ouvir uma história completamente diferente. Para eles a Natureza nunca foi ameaçadora e sim hospitaleira. Obviamente ela tem perigos assim como viver na cidade há perigos. Ao atravessar uma avenida você pode ser atropelado e morto imediatamente. A mesma coisa acontece na Natureza. Se você não sabe viver naquele ambiente ela pode ser bastante perigosa. 






No início o trabalho não existia. Esses povos viviam da caça, da pesca e da coleta. Aqui temos a imagem de duas moças, poderíamos dizer que estão voltando de um passeio no bosque, alguns antropólogos descrevem dessa forma a atividade colher frutos e tudo o mais que precisam. Quanto à pesca, hoje em dia no Brasil milhões de pessoas saem nos finais de semana para pescar como lazer. Os números da indústria da pesca são bastante expressivos. Cerca de 20, 30 milhões de pessoas saem todo final de semana para pescar. Há também aquela famosa frase “tá estressado? Vai pescar”.  A caça por aqui é proibida, mas no mundo o que a gente vê que se tornou esporte de nobres. Na Inglaterra tem a caça à raposa, aquela imagem dos cavalos puro sangue e dos cães farejadores... O rei da Espanha, por exemplo, foi a destronado porque saiu para caçar num momento socialmente inadequado. Então, se olharmos para a Sociedade Tribal vemos que tinham uma vida paradisíaca, como diziam as narrativas antigas. 

 

Aí veio a primeira revolução tecnológica, a Revolução Agrícola, por volta de 10000 a.C., aconteceu onde mais ou menos hoje é o Iraque. Ali aprendemos a plantar, domesticar animais e surgiram as primeiras fazendas. Uma grande diferença entre a Sociedade Tribal e a Sociedade Agrícola é que se num primeiro momento o ser humano pertence à Terra, nesse segundo a Terra passou a pertencer ao ser humano. Foi uma grande mudança cultural. Quando começamos a plantar gastamos uma energia grande nisso, e depois precisamos colher. O esforço empregado nos faz sentir no direito sobre esse produto. Aí começa o trabalho, ou seja, vamos precisar, segundo as narrativas antigas, tirar nosso sustento do suor do nosso próprio rosto. Existe uma queda. Assim o ser humano começou a tomar conta do território e isso foi se expandindo pelo mundo.


 



 

Há uma desconexão com a Natureza, começamos a manipulá-la de acordo com nossos próprios interesses. Surgem também as religiões e isso é uma coisa importante porque ao longo do tempo as Igrejas vão ganhando relevância nas Sociedades Agrícolas. A palavra Religião vem a de religar, ou seja, tentar reconectar o ser humano a uma coisa sagrada que foi perdida e Deus vai se tornando o valor central. 

 

Aqui vemos uma reportagem que saiu em 2020 na Scientific American mostrando o choque cultural que ocorreu quando as Civilizações Agrícolas começaram a conquistar o mundo, se chocando com Sociedades Tribais. Nessa matéria, How Farmers Conquered Europe, vemos uma câmara mortuária onde há um senhor e um jovem que foram enterrados juntos. Os pesquisadores fizeram exames de DNA para verificar quem eram aquelas pessoas e identificaram que, pelo padrão alimentar, o mais velho vinha de uma Sociedade Agrícola e o garoto de uma Sociedade Tribal e possivelmente um escravo. Esses povos foram assassinados e escravizados, como vemos acontecer até hoje aqui na Amazônia com os Ianomâmi e outras tribos. Assim aconteceu lá na Europa por volta de 6000 a.C. e continua acontecendo até hoje por aqui, os fazendeiros invadindo a floresta e dizimando populações. 

 

Nesse slide vemos a imagem de uma colheita no verão de 1565 na Holanda. Na outra, temos Pienza na Itália, uma típica cidade medieval, onde podemos observar os campos no entorno e uma construção mais alta e predominante que é a Igreja, denotando a ideia de Deus como valor central. Os fazendeiros se tornaram Nobres e o poder ficou nas mãos da Igreja e da monarquia. Essa configuração predominou em praticamente todo o período da Sociedade Agrícola. 

 

 



 

Esse sistema já vinha incomodando muita gente e a partir do Renascimento, os estudos e as pesquisas identificavam que não era o Sol que girava em torno da Terra, ao contrário a Terra é que girava em torno do Sol. As verdades da Igreja não se sustentavam mais. Um pouco mais adiante foi desenvolvido o Método Científico por Francis Bacon. Segundo ele, a natureza tem uma racionalidade e é regida por leis. Entender o todo é muito complicado então ele sugeriu olhar as partes e aprofundar o estudo delas e assim conseguir entender o todo. Além de criar esse método de experimentação para descobrir as leis da natureza, ele ainda organizou o conhecimento para que pudéssemos aprender com as pesquisas dos outros. No fundo o interesse era controlar a Natureza, conhecer para controlá-la, essa era a ideia principal. 

 

Baseado em todo o conhecimento científico adquirido, mas ainda sob o domínio da Monarquia e da Igreja, surge o Iluminismo e a figura do Voltaire com seus textos curtos e precisos que influenciaram o pensamento da época. Parece que estamos lendo um jornalista contemporâneo maravilhoso. Ele chegou a ser preso na Bastilha por conta de suas ideias revolucionárias e depois foi deportado para a Inglaterra. Chegando lá conheceu os estudos do Newton e produziu artigos simples numa linguagem muito agradável sobre teorias científicas como a lei da Gravidade (a lei da Atração como chamavam na época), entre outros, com isso ele foi cativando as pessoas, mostrando e aproximando elas da ciência e assim ajudou a abalar o sistema da Monarquia da Igreja na Europa. A ideia do Iluminismo era mudar a sociedade com base na Racionalidade e nas ideias de Liberdade, Fraternidade, Progresso, a Democracia e um Estado separado na Igreja. Hoje vemos essa discussão e sabemos onde começou.

 

O Iluminismo construiu a base para a Revolução Francesa que veio logo a seguir, acabando com o sistema feudal. As monarquias começaram a ser perseguidas na Europa inteira e também a dominação da Igreja, que perdeu boa parte de suas terras que somavam quase metade da Europa. Uma nova classe, de comerciantes e futuramente industriais, a burguesia, assumiu o poder. Vemos ali na outra imagem o quadro do van Gogh onde, por exemplo, não é mais a torre da Igreja que é a construção predominante. São as chaminés das fábricas, invadindo o campo, e também ao lado a frase famosa do Nietzsche no livro A Gaia Ciência: “Deus morreu”. Deus deixa de ser o valor central, agora se busca eliminar as superstições, o pensamento mágico e valorizar a Racionalidade.

 

 



 

 

Com a industrialização houve uma grande migração do campo para as cidades. Aqui no Brasil como tivemos uma industrialização mais tardia eu assisti isso acontecer, mas na Europa aconteceu em 1800. As indústrias são organizações verticais, hierárquicas, centralizadas e focadas na produção em grande escala. Aqui vemos por exemplo uma fábrica de relógios, que também é outro instrumento da Revolução Industrial. Quando vi essa imagem lembrei da minha infância, parece uma sala de aula, aí pensei, poxa todo o sistema de ensino foi preparado para nos colocar na indústria. 

 

A Racionalidade como valor central, vemos a reprodução disso na arquitetura, nas linhas retas a lógica, a ideia do Progresso, o planejamento, a padronização, a produção em massa, isso tudo ia se reproduzindo na sociedade.


 



 

De repente aconteceu o que ninguém esperava. Duas grandes guerras na Europa. Duas grandes guerras devastaram completamente Europa e acabaram colocando o mundo inteiro nessa história. No início da formação da ONU, quando ainda se chamava a Liga das Nações, pediram para algumas personalidades se comunicaram com outras à sua escolha, sobre temas relevantes para o mundo. Einstein foi uma delas e resolveu se corresponder com Freud, perguntando: É possível vivermos sem as guerras? E Freud respondeu numa carta de umas 8 ou 10 páginas muito interessante. “A situação ideal, naturalmente, seria a comunidade humana que tivesse subordinado a sua vida instintual ao domínio da razão, no entanto, com toda a probabilidade isso é uma expectativa utópica”. Ou seja, nós somos racionais até a página 2, 3 no máximo. Começa a haver uma descrença nas teorias modernistas na liderança centralizada e também na própria racionalidade humana. 

 



 

 

Aqui começa uma nova revolução. Norbert Winer, matemático e filósofo, professor do MIT, ele estava pesquisando sobre artilharia antiaérea porque no final da segunda guerra os aviões estavam quase tão rápidos quanto as balas de maneira que era quase impossível acertá-los. Era preciso atirar num ponto futuro, imaginando onde o avião estaria. Deram esse desafio para o Winer e ele percebeu que precisava criar máquinas inteligentes e além disso, como essas máquinas eram operadas por seres humanos, teriam que além ser inteligentes, se comunicar o ser humano. Ele publicou um livro chamado Cybernetics, or Control and Communication in the Animal and the Machine (e aqui sublinho a palavra Communication). As respostas que estavam precisando estavam justamente nos sistemas vivos, as máquinas precisavam parecer com sistemas vivos. A ciência tinha se desenvolvido muito, dentro de cada disciplina, mas elas não se comunicavam. Winer percebeu que muitas respostas que precisava já haviam sido desenvolvidas em outras disciplinas como a Biologia, a Neurociência, etc. Este foi o início da inteligência artificial que o presidente do Google falou que vai transformar a humanidade mais do que o fogo. Por isso que digo que não estamos vivendo a quarta Revolução Industrial e sim uma nova Revolução.

 

Winer ajudou a organizar e participou de reuniões que foram chamadas de Cibernética, ou Macy Conferences. Uma fundação norte-americana chamada Macy Foundation, com o objetivo de reunificar a Ciência e colocar os cientistas para conversar, logo após a 2ª Guerra Mundial em 1946, chamou grandes nomes da Matemática, da Física, da Psicologia, Engenharia, Medicina, Neurologia, Antropologia, Sociologia, Linguística, Ecologia e mais alguns. Foram feitos 10 encontros entre 1946 e 1953 em Nova Iorque, no Beacon Hotel. Eram eventos de 2 dias, em cada dia eram apresentadas cerca de 4 pesquisas. Um apresentava e os outros, questionavam, perguntavam, criticavam. Eram conversas interdisciplinares e podemos imaginar que não se consegue aprofundar muito, é uma coisa meio rasa porque um entende mais ou menos o que o outro está dizendo, mas há muita analogia conhecimento de uma área que pode ser utilizado em outra. Einstein, por exemplo, foi convidado, mas não aceitou participar desses encontros. Ele achava que pouca coisa poderia surgir de conversas tão superficiais. Mas nesse caso surgiram os computadores, os softwares, a internet, a inteligência artificial, a psicologia de família e tantas outras, que juntas acabaram transformando o mundo em que vivemos. 


 



 

A única mulher que participou daquele encontro foi a socióloga e antropologa Margareth Mead. Ela descreveu a Cibernética como “uma forma de pensamento interdisciplinar que possibilitou que membros de muitas disciplinas se comunicassem facilmente em uma linguagem que todos pudessem entender”. Então todo mundo baixou um pouquinho nível mas a troca foi rica. Gregory Bateson, outra figura importantíssima que participou dessa dessas conferências, vinha de uma tradição de Cambridge. Seu pai foi um biólogo que cunhou o termo Genética. Ele seguiu a carreira do pai na ciência e disse “na revolução industrial do século XIX o ser humano ficou enormemente arrogante pensou que poderia controlar o universo e a si mesmo acho que a Revolução Cibernética teve o efeito contrário, indicando que o ser humano tem um controle limitado. Há limites sobre o que podemos planejar e prever sobre os sistemas que fazemos parte. Essa palavra “sistemas” foi utilizada porque Bateson foi um dos pioneiros do pensamento sistêmico. 

 

Os principais conceitos da Cibernética foram os seguintes. 

 

1) O Pensamento Sistêmico, procurar ter um olhar mais amplo para as coisas, olhar o todo. E como é que faz para olhar o todo? A nossa visão individual é bastante limitada, mas se ouvirmos os outros, ou seja se ouvirmos as outras visões, outros pontos de vista, você consegue ter um entendimento mais amplo e procurar talvez ter uma visão próxima do todo, como ocorreu nos encontros das Macy Conferences. A ideia era olhar para as inter-relações entre as partes, e não só para cada uma das partes, como foi a proposta de Francis Bacon no início do Método Científico. Os Sistemas Operacionais surgiram do Pensamento Sistêmico, a visão do Ecossistema também surgiu dali. Procuravam entender a Comunicação entre as partes de um sistema e entre os sistemas que estão interligados. Como é que faz uma mão pegar um lápis? Sai uma informação do cérebro que passa pelos músculos e tendões do braço, passa pelos dedos, há todo um processo de comunicação entre várias partes para se conseguir executar uma tarefa e há também a comunicação entre cada um dos sistemas em que nós estamos envolvidos. A ideia era justamente a estabelecer um diálogo colaborativo porque entendiam que era na inter-relação que estava a riqueza. Foi a abertura para o diálogo que gerou a faísca para essa revolução.

 

2) A Circularidade, Feedback. Obviamente eu sou um leigo aqui, há muitas pessoas no IPT especialmente que entendem muito melhor do que eu o que isso quer dizer. A noção de feedback quando falamos de pessoas nas organizações, vem da Cibernética. A ideia é que um organismo gera impacto no ambiente, e o ambiente responde a essa ação, então há uma relação circular, uma recursividade, não mais a questão de causa e efeito, mas uma coisa é a causa e o efeito, tem uma circularidade nessa história.

 

3) O conceito de Homeostase, o processo de auto regulação de um organismo para que ele funcione bem. A tecnologia aeroespacial, o piloto automático, surgiu dessa ideia. No espaço você não vai conseguir operar uma máquina, então a máquina precisa se autorregular. Eles foram traduzindo os conhecimentos dos sistemas vivos para as máquinas. 

 

4) A Interdependência e Complementaridade, para fazer o que eu preciso dependo que o outro faça a parte dele.

 

5) O conceito de Gaia, a Terra vista como um grande organismo, isso é cada vez mais aceito, ainda não é completamente mas a ideia surgiu também da Cibernética.  


 



Isso tudo aconteceu no final dos anos 1940 e 1950. Quem estava nas Universidades foi bastante influenciado por esse movimento da Cibernética, por esse jeito de pensar. Mas aí veio mais uma guerra. A guerra do Vietnã, e a turma resolveu dar um basta. Então vemos essa cena de Woodstock em 1969, os jovens questionando mais uma vez a hierarquia, a autoridade, o formalismo... então esses malucos foram trabalhar. Montaram startups baseadas em computadores e softwares. Microsoft, Apple e muitas outras, como sabemos, se tornaram as maiores empresas do mundo. Os doidos das Universidades americanas construíram essa Revolução a partir da Cibernética.


 



 

Em 1972, logo na sequência, temos um primeiro “gato no telhado”. O estudo Limits to Growth foi publicado pelo Clube de Roma, um grupo de cientistas, empresários, ex-chefes de Estado e funcionários de alto escalão público, fizeram simulações com sistemas de computador e verificaram que como todos os países e economias estão pautadas no crescimento, repetem o mantra de que “precisamos crescer o PIB”, “precisamos crescer o PIB”, et cetera, as empresas também pautadas no crescimento, mas o mundo é limitado... como é que fecha essa conta? Segundo esse estudo “a humanidade enfrenta ameaças de colapso sistêmico (eles também vêm da tradição do pensamento sistêmico). “Muitas décadas de crescimento exponencial da população e do consumo estão agora colidindo com os limites da Biosfera da Terra desestabilizando os fundamentos da vida como a conhecemos”. Esse foi o primeiro “gato no telhado”.

 

Ai veio a Internet e caiu como uma bomba na sociedade. Um artigo de 1994 de um sujeito chamado Michael Strangelove é impressionante, a visão que ele tinha já nesse período. “Na era da informação, o principal meio de produção não é mais a fábrica mas a mente criativa independente e um computador de US$1000”. Então qualquer um pode hoje em dia fazer o que quiser com muito pouco. Antigamente você precisava ter um capital muito grande, hoje em dia é menos ou quase nada. “A internet democratizou o acesso aos mercados globais”. Antes para você vender produtos mundo afora você precisava de uma estrutura de uma multinacional hoje em dia com a internet não é mais necessário. Ele complementa, “esse é o início do êxodo em massa do mundo corporativo à medida que os empreendedores se envolvem no poder do Cyberespaço”, e aí obviamente com uma menção à Cibernética, ou seja, os jovens, as grandes cabeças, não querem mais fazer carreira em corporações, querem montar o próprio negócio e aqueles que querem seguir carreira fazem para aprender alguma coisa para depois montar o próprio negócio. 

 

Temos aqui a imagem do modelo hierárquico da Sociedade Industrial, com as estruturas verticais, centralizadas e a Razão com o valor central. E ao lado a Sociedade em Rede, com estruturas anárquicas, horizontais, informais, descentralizadas, adaptáveis e a Comunicação com o valor central. O valor central dessa nova revolução é a Comunicação.

 


 

Aqui no Brasil tivemos durante muito tempo a experiência de um modelo ainda da Sociedade Industrial onde uma empresa era monopolista da comunicação. Era a mídia de massa, uma voz, unidirecional. Essa empresa falava e nós assistíamos em casa, pelo televisor. Hoje na Sociedade em Rede são múltiplas vozes, todo mundo tem vóz, todos criamos conteúdos, todo mundo se comunica com todo mundo por meio das mídias sociais. Na Internet você assiste o que quiser, a hora que quiser. Isso mostra a diferença de um modelo para o outro, modelo depois da Cibernética, especialmente depois da Internet.

 




 

Vemos o fim dos padrões. Temos aqui 2 outdoors da Calvin Klein, num de 2009, vemos um padrão clássico, europeu, um tipo Barbie, e depois em 2020, bem recente essa mudança, não é um novo padrão, pelo contrário, essa é representação da diversidade. Percebemos também uma tendência de migração de produtos para serviços. Eu estava conversando há pouco com o Prof. Ricardo Yogui (PUC-RJ) e Eduardo Vaz (Superintendente do IEL), estavam comentando que o Omo (marca de sabão em pó) está agora inaugurando redes de lavanderias, saindo de uma estrutura vertical indo para uma estrutura horizontal, saindo exclusivamente de produtos e indo para serviços. Aqui temos por exemplo o Spotify, hoje não tem mais o CD, não tem o disco, você paga uma assinatura e ouve a música que você quiser. Com o Uber não precisamos mais ter carro. O AirBnB não tem um hotel sequer. Ele facilita o sistema de reservas para quem quiser se hospedar, enfim há muitos exemplos.

 

Em 2007 temos um segundo “gato no telhado”. O IPCC - International Panel for Climate Change apontou que que não restam dúvidas de que a ação humana é o principal fator das mudanças climáticas. Isso foi um grande choque. Obviamente há um discurso ainda dominante falando que não é bem assim, que isso é controverso, mas aqui foram alguns milhares de cientistas que fizeram o estudo e assinaram esse documento. Resgatando uma frase do Bateson, “os maiores problemas do mundo são o resultado da diferença entre como a natureza funciona e como as pessoas pensam”. 

 

Em 2011 pela primeira vez o Antropoceno é colocado em uma revista científica, a Philosophical Transactions. Divulgam que a ação humana no clima, nos oceanos e na Terra é tal que consideram isso um novo momento da era geológica. 

 

Em 2019, uma notícia que não vi publicada aqui no Brasil na grande mídia, foi uma das mais importantes e impactantes dos últimos tempos. Os CEO’s das 200 maiores empresas dos Estados Unidos se reuniram num encontro chamado Business Roundtable, foram Apple, JP Morgan, Amazon e por aí... eles chegaram à conclusão que a não dá mais para uma empresa funcionar como funcionava antigamente. Até aquele momento o objetivo final de uma empresa era gerar lucro para seus acionistas, ponto. Depois dessa reunião o objetivo de uma empresa passou a ser gerar o resultado para todos os stakeholders.  Stakeholders são os acionistas, sem dúvida, mas também funcionários, clientes, fornecedores, governo, ambiente e todos que são de alguma forma afetados pela atuação daquela organização. Uma historiadora de Harvard disse que eles estavam respondendo ao “Zeitgeist”, o espírito da época, eles perceberam que “business as de usual” não é mais aceitável. Foi isso que deu força para o que chamamos hoje de ESG. 


 



 

Temos então um sistema em declínio, a Sociedade Industrial, e um sistema emergente da Sociedade em Rede. Vemos uma tendência da padronização, da linearidade, para a diversidade, a pluralidade, a complexidade. De um sistema vertical, hierárquico, para horizontal, informal, anárquico. De um sistema de controle para o empoderamento. Da autoridade, de uma só voz, para múltiplas vozes influenciadoras, vemos os “influencers”. Da competição para a cooperação, colaboração. Da valorização do individualismo para a interdependência. Da mídia de massa para as mídias sociais. De produtos para serviços e experiências. De criar valor para os acionistas para criar valor para todos os stakeholders. Do lucro a qualquer custo para o impacto positivo. Da meta para o propósito. De jovens ensinados a obedecer para jovens ensinados a questionar. 

 




Portanto, se eu fosse criar uma empresa ou tivesse que recomendar isso a alguém, seria melhor criar uma organização adequada ao sistema emergente, no espírito da nossa época. Uma empresa que valorize a diversidade, a pluralidade, que empodere as pessoas, que dê voz para as pessoas, onde os jovens tenham espaço para questionar e contrubuir com seus conhecimentos, um espaço colaborativo e não competitivo, etc. Se você criar uma organização com esses valores da Sociedade em Rede, acredito que seja mais provável ela prosperar nesse mundo que estamos vivendo. Outra coisa também que eu queria dizer é que a área de pessoas, que cuida da comunicação, das relações na empresa, na minha opinião vai se tornar cada vez mais relevante, mais importante. Eu ainda não vi ninguém do RH que chegasse à podição de CEO, mas eu acho que eu vou ver isso em breve, não um mas muitos.

Isto é o que eu tinha para apresentar, queria agradecer a oportunidade e convidar todos para fazer uma experiência de diálogo colaborativo com Celso Alvim (maestro do Monobloco), vamos lá?

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