Dez 2020Se pudesse fazer somente o que gosto, passaria os dias estudando e fazendo esporte junto à natureza, fora dos grandes centros, de preferência no meio de uma floresta, com minha família e alguns amigos por perto. Uma vida quase monástica numa cabana simples de madeira com lareira, internet, um bom equipamento de som e um rio de água limpa ao lado para tomar banho. Foi num lugar parecido com esse que comecei a trabalhar sobre o texto de Os Lusíadas.
A poesia entrou na minha vida por volta dos 25 anos de idade. O que me atraia nesses textos era a capacidade dos poetas de dizerem muita coisa em poucas palavras. Numa sala de espera ou até mesmo no banheiro, era possível captar toda uma idéia, um “universo numa casca de noz”.
Eu gostava de ler obras completas e assim ter uma noção de todo o pensamento do autor, escolher os poemas que gostava, grifar frases e anotar alguns comentários. Por ser mais natural para mim, comecei lendo principalmente poetas de língua portuguesa e espanhola como Fernando Pessoa, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Castro Alves, Manoel de Barros, Vinícius de Moraes, Pablo Neruda, Garcia Lorca, até chegar em Camões.
Como morei sozinho até os 36 anos, era comum sair para jantar com eles. Levava o livro embaixo do braço e ao invés de conversar com alguém, "ouvia" essa gente me contar coisas sensacionais. Evidentemente me sentia meio esquisito. Quem o vê jantando sozinho com um livro geralmente supõe que você tem algum problema grave. Mas depois da segunda cerveja a conversa com os poetas fluía bem.
No final dos anos 1990, durante o curso de especialização em psicologia na PUC, escolhi como tema analisar Os Lusíadas a partir dos conceitos da Psicologia Analítica. Essa obra me acompanhou durante 6 anos, e o estudo foi aprofundado e concluído na minha dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica em 2006.
Os Lusíadas foi publicado no final do século XVI e se tornou um marco na literatura mundial por retratar uma mudança cultural que nos acompanha desde então. Ele sinalizou o início do Capitalismo. Diferente dos grandes poemas épicos como Ilíada e Odisseia cujos protagonistas eram heróis guerreiros, ou dos contos de cavalaria da Idade Média que enalteciam os heróis cavaleiros, Os Lusíadas têm como figura central um herói empreendedor, que desbravou mares nunca antes navegados para abrir uma rota de comércio com o Oriente.