Fevereiro 2025
O filósofo francês Gilles Lipovetsky fez um importante estudo sobre o luxo. Tive a oportunidade de assistir sua palestra no IPLA e depois jantar com ele, a convite de Jorge Forbes, no restaurante Le Vin - São Paulo, em 2012. Recentemente revisitei esse tema num curso de Antropologia do Consumo na PUC/RJ. Procurei resumir no texto abaixo, os principais pensamentos de Lipovetsky a partir de anotações da palestra.
O luxo tem sido um tema de debate filosófico por séculos e pode ser analisado de duas formas distintas. A perspectiva tradicional, enraizada no pensamento greco-romano, vê o luxo como sinônimo de orgulho e vaidade, algo moralmente condenável por ser supérfluo, desnecessário e ligado à decadência dos costumes. Para Platão, por exemplo, o luxo representava uma ameaça moral e social, associada à injustiça, pois poucos desfrutam dele enquanto muitos vivem na privação.
No entanto, podemos abordar o luxo de outra maneira, como um fenômeno antropológico. Em vez de julgá-lo moralmente, devemos compreender por que os seres humanos sempre foram atraídos pelo excesso e pelo desperdício e como o luxo transformou sociedades ao longo da história. Como ensinou Spinoza, é necessário primeiro compreender antes de condenar.
Em todas as sociedades conhecidas, o luxo sempre esteve presente, o que desbanca a ideia ultrapassada de que os primeiros humanos viviam exclusivamente em luta pela sobrevivência. A visão evolucionista do século XIX, defendida por Marx e Engels, sugeria que o luxo só surgiu quando as sociedades começaram a acumular riqueza. No entanto, a antropologia refuta essa tese, mostrando que formas de luxo existiam muito antes do Neolítico, antes da domesticação de plantas e animais, da cerâmica e da metalurgia.
Mesmo entre os caçadores-coletores do Paleolítico, encontramos evidências de luxo, não na forma de bens materiais acumuláveis, mas por meio de adornos, festas e rituais. Essas sociedades valorizavam a partilha e o prazer imediato, consumindo seus recursos em festas e cerimônias em vez de estocá-los. Esse comportamento evidencia que o luxo não surgiu apenas com a acumulação de riqueza, mas faz parte da essência do ser humano.
Com a transição para sociedades agrícolas, o luxo assumiu novas formas. A riqueza passou a ser materializada, mas ainda era frequentemente redistribuída. O antropólogo Bronislaw Malinowski, ao estudar os povos da Melanésia, observou a prática do Kula, um sistema de troca de objetos valiosos onde a generosidade era essencial. Recusar um presente era visto como um ato de hostilidade, e o luxo estava mais no ato de dar do que em acumular.
Além de seu papel social, o luxo tinha funções religiosas, cósmicas e mágicas. Muitas sociedades antigas acreditavam que o desperdício ritual de riqueza ajudava a manter o equilíbrio cósmico. Festivais religiosos envolviam gastos extravagantes e destruição de bens para renovar a ordem social e espiritual. Outra função essencial do luxo era a conexão com os mortos. Muitas culturas enterravam riquezas junto aos falecidos para garantir proteção e evitar calamidades, reforçando a importância simbólica do luxo.
Dessa forma, o luxo não pode ser reduzido a um mero subproduto do excedente econômico. Sua origem está profundamente ligada ao pensamento religioso e metafísico, sendo um fenômeno mágico e cósmico antes de se tornar um aspecto materialista da vida humana.
O surgimento do Estado, por volta do quarto milênio a.C., trouxe uma mudança significativa no luxo. Com o surgimento do poder centralizado e das divisões de classe, o luxo deixou de ser um elemento redistributivo e passou a representar a concentração de riqueza e a estratificação social. A distinção entre luxo aristocrático e popular se tornou evidente. A elite construiu palácios, se adornou com roupas opulentas e se cercou de arte, utilizando o luxo como uma ferramenta de status e dominação.
Essa transformação continuou ao longo da história, especialmente durante o Renascimento, quando a aristocracia italiana começou a colecionar antiguidades e a encomendar obras extravagantes para demonstrar sua superioridade cultural. No entanto, com a Revolução Industrial, o luxo passou por uma democratização, se tornou mais acessível à classe média. A alta-costura surgiu como uma nova expressão do luxo, combinando artesanato, marca e criatividade artística. A identidade dos criadores começou a ganhar importância, deslocando o poder dos aristocratas para os designers e as marcas.
Hoje, o luxo é uma indústria global controlada por grandes corporações multinacionais, como a LVMH, que detêm dezenas de marcas de luxo e transformou o setor num império econômico. O luxo moderno é altamente midiatizado, com campanhas publicitárias agressivas e lançamentos constantes de novos produtos.
Paralelamente, acontece uma mudança nos valores do luxo contemporâneo. O chamado “luxo experiencial” está crescendo, refletindo a busca por bem-estar, exclusividade e realização sensorial, em vez da mera posse de bens materiais. Isso se manifesta em experiências como viagens de alto padrão, retiros de bem-estar e serviços personalizados que priorizam o conforto e a exclusividade sobre o espetáculo da ostentação.
O luxo portanto não é apenas um excesso econômico, é uma expressão existencial. Ele representa uma tentativa de transcender o tempo, resistir à efemeridade e buscar permanência. Uma aspiração profunda pela eternidade que acompanha o ser humano desde seus primórdios.
Essa transformação continuou ao longo da história, especialmente durante o Renascimento, quando a aristocracia italiana começou a colecionar antiguidades e a encomendar obras extravagantes para demonstrar sua superioridade cultural. No entanto, com a Revolução Industrial, o luxo passou por uma democratização, se tornou mais acessível à classe média. A alta-costura surgiu como uma nova expressão do luxo, combinando artesanato, marca e criatividade artística. A identidade dos criadores começou a ganhar importância, deslocando o poder dos aristocratas para os designers e as marcas.
Hoje, o luxo é uma indústria global controlada por grandes corporações multinacionais, como a LVMH, que detêm dezenas de marcas de luxo e transformou o setor num império econômico. O luxo moderno é altamente midiatizado, com campanhas publicitárias agressivas e lançamentos constantes de novos produtos.
Paralelamente, acontece uma mudança nos valores do luxo contemporâneo. O chamado “luxo experiencial” está crescendo, refletindo a busca por bem-estar, exclusividade e realização sensorial, em vez da mera posse de bens materiais. Isso se manifesta em experiências como viagens de alto padrão, retiros de bem-estar e serviços personalizados que priorizam o conforto e a exclusividade sobre o espetáculo da ostentação.
O luxo portanto não é apenas um excesso econômico, é uma expressão existencial. Ele representa uma tentativa de transcender o tempo, resistir à efemeridade e buscar permanência. Uma aspiração profunda pela eternidade que acompanha o ser humano desde seus primórdios.
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