A morte do curriculum vitae

Por Borja Vilaseca
El Pais
Fevereiro 2015



Este artigo foi escrito para quem está desempregado neste exato momento. Para quem sofre de frustração e impotência ao verificar que não encontra um emprego. Para quem há algum tempo sente que enviar currículos se transformou em uma perda de tempo. E, definitivamente, para quem deixou de ter medo de se reinventar profissionalmente porque já não tem nada a perder. Para todos vocês, descrevemos a seguir um percurso de nove etapas. Cada uma delas representa um caminho que o leitor deverá percorrer por conta própria. Boa viagem.



1. Tome as rédeas de sua vida profissional. A crise explicitou a necessidade de transformação do modelo produtivo que rege nosso sistema econômico. Coube a nós viver o fim da era industrial e o início da era do conhecimento. As regras do jogo profissional mudaram e continuarão mudando, cada vez mais depressa. As instituições estabelecidas já não têm a capacidade de garantir segurança econômica para os cidadãos. Os contratos de trabalho por tempo indeterminado estão diminuindo. E para muitos chegou a hora de encarregar-se pessoalmente do trabalho. E de realizar uma função profissional útil, criativa e que faça sentido, que de preferência não possa ser automatizada e digitalizada pelas novas tecnologias, tampouco ser terceirizada para um país em desenvolvimento.

2. Cultive a inteligência emocional. Estar desempregado é uma situação profissional muito complicada de lidar. No entanto, para conseguir iniciar um processo de mudança, é importante não nos deixar levar pela reclamação, pela vitimização ou pela culpa, pois com isso só conseguiremos consumir a energia vital de que necessitamos para buscar novas soluções e alternativas. É fundamental investir tempo em nos conhecer em profundidade, aprendendo a cuidar da nossa autoestima e a cultivar a confiança em nós mesmos. Na medida em que desenvolvemos nossas fortalezas internas, começamos a enfrentar a adversidade de forma mais responsável, otimista e eficiente. E, à base de treinamento, verificamos que nosso grau de satisfação não tem tanto a ver com nossas circunstâncias, mas com a atitude que tomamos diante delas.

3. Treine a inteligência financeira. Em geral, as crenças sobre o dinheiro passam de geração em geração por inércia, sem nos darmos conta. Do mesmo modo que não escolhemos nosso time de futebol, nossa visão profissional e financeira do mundo foi pré-fabricada; é item de série. Não nos ensinaram a resolver nossos próprios problemas econômicos sozinhos. Cultivar nossa inteligência financeira nos capacita a fazer orçamentos, dando-nos a oportunidade de gerar excedentes para economizar, investir e não depender de empréstimos ou dívidas. Também nos mostra como ganhar mais e gastar menos, emancipando-nos das instituições estabelecidas.

4. Descubra seu propósito profissional. Em vez de fazer o que se diz que temos de fazer (buscar saídas profissionais), é hora de encontrar nosso verdadeiro propósito. E para isso é essencial escolher um caminho profissional que faça sentido para nós. Para além dos motivos típicos que nos movem a trabalhar (dinheiro, poder, segurança, comodidade ou reconhecimento), temos de nos conectar com uma motivação intrínseca que nos permita conceber nossa profissão de forma mais vocacional. Para isso, temos de redefinir nosso conceito de sucesso, assim como os valores que queremos que guiem nossas decisões e ações. O que faríamos profissionalmente se não tivéssemos de ganhar dinheiro? A que nos dedicaríamos se soubéssemos que tudo vai dar certo? O que faríamos se não tivéssemos medo? Saber a resposta dessas perguntas não tem preço.


5. Decida seu papel profissional. Cerca de 85% dos profissionais espanhóis trabalham como “funcionários”, vendendo seu tempo em troca de um salário no fim do mês, e fazendo parte de um sistema produtivo que enriquece outras pessoas. Mas além desse papel profissional existe o de “empreendedor”. Ou seja, aquele que trabalha para si mesmo como autônomo ou freelancer, ou que monta um projeto e contrata outras pessoas. Cada um conta com uma série de vantagens e desvantagens, exige um tipo de mentalidade específico e é acompanhado de um determinado estilo de vida. É por isso que passar de funcionário a empreendedor implica em uma mudança profunda na forma de se relacionar com o mercado de trabalho. E como a segurança profissional está na berlinda, é uma questão de escolher entre a incerteza do funcionário e a incerteza do empreendedor.

6. Faça algo que o apaixone e que potencialize seu talento. Apesar de termos sempre ouvido que “não podemos ganhar o pão fazendo o que gostamos”, na hora de se reinventar é fundamental nos dedicarmos a uma profissão que nos motive e interesse de verdade. Só assim encontraremos a força e a dedicação para dar o melhor de nós, potencializando nossas virtudes e habilidades. Todos temos algum tipo de talento a descobrir e desenvolver. Em essência, o talento é a forma pela qual expressamos nosso valor. Isso sim, os dons que são necessários para realizar as novas funções profissionais não têm nada a ver com a educação industrial ou as aptidões acadêmicas convencionais. Em vez disso, surgem quando nos comprometemos com nosso processo de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. Quando mais nos conhecemos, mais nos valorizamos por sermos quem somos. E quanto mais nos valorizamos, mais sabemos para que servimos e como podemos ser úteis para a sociedade.

7. Encontre um problema social que o motive a resolver. As pessoas estão dispostas a pagar por produtos e serviços que atendam às suas necessidades e satisfaçam suas aspirações. O desafio está em saber que problemas podemos resolver fazendo o que gostamos usando nossos talentos. Também é importante criar “propostas de valor” que melhorem a qualidade de vida de outras pessoas. Ao mesmo tempo, é fundamental conhecer as últimas aplicações e ferramentas digitais que podemos empregar na Internet, concebendo assim novas formas de agregar valor ao mercado profissional.

8. Invista em formações específicas. Nesse ponto do caminho pode ser decisivo assistir a seminários que nos ensinem a “saber como” e a “ter com que” expressar nosso talento. Nesse sentido, a universidade convencional parece estar deixando de ser a única opção. Quanto do que estudamos nos foi realmente útil para desempenhar nosso trabalho atual? A nova formação será cada vez mais focada em oferecer cursos práticos que nos ensinem a desenvolver habilidades que nos permitam resolver problemas concretos. O investimento mais importante tem de ser feito em nós mesmos. Nossa inteligência, nossa criatividade e nosso talento são nossa principal fonte de riqueza.

9. Desenvolva sua marca pessoal. O marketing está se democratizando e se personalizando. E cada vez mais será protagonizado pela “marca pessoal”. Uma vez que temos claro o que oferecemos, o desafio é descobrir como oferecer. Ou seja, a maneira como nos comunicamos e conectamos com as pessoas a quem nossos serviços podem servir. É primordial montar uma página na web explicando os benefícios e soluções que oferecemos, utilizando as redes sociais para nos apresentar a nossos potenciais clientes. Por meio de nossa marca pessoal conseguimos que nossa profissão seja um reflexo da pessoa que somos, aprendendo a ganhar dinheiro como resultado de criar riqueza para a sociedade.



1. LIVRO
O elemento-chave, de Ken Robinson. Ediouro.
Um ensaio que questiona o sistema educacional industrial contemporâneo.
2. FILME
Em busca da felicidade, de Gabriele Muccino
A odisseia de um pai com um filho de cinco anos que luta para tornar realidade o sonho de prosperar profissionalmente.
3. MÚSICA
Hopeless emptyness, de Thomas Newman
Da trilha sonora do filme Foi apenas um sonho, de Sam Mendes, na qual Leonardo DiCaprio interpreta um homem que não acredita em seu trabalho, mas cujo medo o impede de iniciar um processo de reinvenção profissional.


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