por Fernando Laborda
La Nacion
julho 2012
tradução Dado Salem
Os últimos discursos públicos da presidente (Cristina Kirchner) estão causando uma polemica que envolveu não só os analistas políticos, mas também
especialistas em psicologia e semiótica. Cristina Fernández de Kirchner padece
de severas explosões emocionais ou tudo faz parte de uma simulação? Segue
gravemente afetada pela morte de seu marido ou dramatiza dores de viúva que
ajudaram-na a obter grandes resultados eleitorais? Sofre de ataques paranóicos
quando denuncia tentativas de “destituentes” por todos os lados ou isso é parte
de um estudado exagero com fins políticos? Essas são algumas das questões
levantadas entre esses profissionais, a permanente auto-referencialidade que a
presidente manifesta constantemente em suas cuidadas aparições na midia argentina.
Desde a morte repentina de Nestor Kirchner, a presidente não mudou sua imagem, mantem até hoje a cor negra de seu vestido e, provavelmente,
assistida por especialistas em marketing político, começou a mostrar mais suas
emoções. Assim como ninguém pode duvidar da dor gerada pela morte de um ente
querido, também é verdade que o sentimento genuíno pode ser exagerado.
Uma das doenças mais propensas à teatralidade é a
histeria, como assinala o médico psicanalista Jorge Kury, para quem neste
quadro, pode-se observar a tendência de se tornar vítima e colocar a culpa nos
outros.
Claro que por trás dessas características bastante óbvias,
como o drama e a histeria, podem estar ocultos distúrbios narcísicos, cujas características
tendem a ser uma preocupação constante para definir sua própria identidade, uma
sensação desproporcional de auto-importância, a falta de empatia, orgulho,
inveja, e a crença de que a causa do sofrimento é a inveja dos outros.
O narcisismo é uma coisa que afeta a todos nós, tendo em
vista que ninguém poderia viver sem o amor de si mesmo. Mas quando o narcisismo
ultrapassa certos níveis, dificilmente pode falar de amor e, provavelmente,
como Kury destaca, poderia diagnosticar uma forma mais grave, como a bipolaridade.
"É fácil ver o narcisismo em quem se atribui grandezas inexistentes, mas
também podemos encontrá-lo na depressão", ressalta.
Os especialistas concordam que os pacientes acometidos pelo
narcisismo, além de seus outros sintomas, tem um que os tornam quase
impermeáveis à psicoterapia: a incapacidade de aceitar a opinião do médico,
derivada da convicção que lhes dá seu próprio senso de grandeza.
Voltando à presidente, poderia-se conjecturar que sua
escassa disposição para o diálogo com a oposição, com a imprensa ou até mesmo com
seus próprios ministros, derivaria desse narcisismo e que isso também gera uma
espécie de autocensura em seus principais assessores no momento de trazer as más
notícias. Daí a causa de todos os males do país está "no mundo que caiu
sobre nós" e não nos erros econômicos de seu próprio governo.
A reeleição conseguida no ano passado com 54% dos votos,
após a derrota eleitoral de 2009, impulsionou o surgimento do cristinismo indo
além do kirchnerismo, e aprofundando características deste, como o
verticalismo, o personalismo, o hiperpresidencialismo, a concentração de
decisões em uma mesa cada vez menor, e a inflexibilidade na negociação com a
oposição. O show exagerado ao mostrar que se governa enfrentando "grupos
concentrados" e as "empresas" é outra característica que o
cristinismo acentuou.
A voracidade presidencial por introduzir dirigentes de sua
confiança no legislativo e em La Campora (organização política de jovens) sem
consultar governadores provinciais ou lideranças locais; sua nova paixão por
controlar com lupa as administrações provinciais, como Buenos Aires, de Daniel
Scioli; por dizer aos cidadãos o que fazer com suas economias ou para induzir
as empresas privadas a tomar certos caminhos, mesmo que contrários aos seus
interesses, retratam a tendência cristinista ao abuso de poder.
Aparece no estilo sem calma interior que caracteriza os
discursos presidenciais em que não faltam desqualificações, humilhações e
outras formas de violência verbal, manifesta ou elíptica.
Um estilo às vezes próprio daqueles que só falam com o
chicote na mão, como quando há alguns dias anunciou que os bancos devem
emprestar 5 por cento de seus depósitos ao setor produtivo a uma taxa de juros
fixa não superior a 15 por cento, negativa em termos da inflação. "Eles
serão obrigados a emprestar à produção de bens e serviços. E não venham com a
história que ninguém vai pedir", transmitiu a presidente aos banqueiros.
O mesmo tipo de assédio pode ser visto na crítica da chefe do
Estado a governadores que acusa de não conseguirem gerir tão bem como ela,
esquecendo-se de que o governo federal se apropria de recursos do Banco Central
e da Anses (seguridade social argentina) para cobrir seu crescente déficit
fiscal, com o consequente declínio das reservas internacionais e o adiamento do
pagamento da dívida com os aposentados.
A prática de jogar sempre a culpa nos outros, combina com a
distorção das estatísticas oficiais e o duplo discurso. Em termos econômicos, é
curioso que o Governo procure se diferenciar do "neo-liberalismo dos anos
90", enquanto favorece uma taxa de câmbio sobrevalorizada como prevalecia
naquela época, que misturado com a inflação elevada está desencadeando um
coquetel mortal para competitividade argentina.
Com a decisão oficial de proibir a compra de dólares
poupança, através de uma comunicação do Banco Central, poderia-se dizer que o crischavismo
já uma realidade. As semelhanças com a impossibilidade de adquirir moeda
estrangeira vigente na Venezuela de Hugo Chávez são mais do que notórias.
A justificativa das restrições para operar no chamado
Mercado Único e Livre de Cambio - que já nada tem de único e muito menos de livre
– foi dada por parte da titular do BCRA (Banco Central argentino) Mercedes
Marco del Pont. Na página 12 ela revela que as opções eram "aceitar uma
mudança brusca de taxas de câmbio, financiar a fuga de capitais com empréstimos
externos ou limitar temporariamente o acesso a dólares para a poupança."
O governo escolheu a última opção e validou a idéia de um
papel cada vez mais intervencionista do Estado, tendendo a uma estranha ligação
com as políticas de Carlos Menem e Fernando de la Rua, caracterizada pelo
atraso cambial que explodiu com a crise de dezembro de 2001.
Mais que um ferrolho cambial deveria se falar de uma
armadilha à poupança, porque a suposta batalha cultural do cristinismo pela
desdolarização está terminando por enterrar a velha cultura de que a poupança
era a base da fortuna. Hoje não há nenhuma alternativa de poupança legal para
quem quer ter uma aposentadoria tranquila em um país com benefícios de pensão
miseráveis. Também não existe qualquer alternativa para aqueles que apenas
procuram manter seu poder aquisitivo com a inflação em 25% ao ano.
A partir de amanhã, os olhos dos agentes econômicos vão estar
na diferença entre o dólar oficial e o paralelo, e o índice de fuga de
depósitos bancários, à espera do próximo capítulo da aventura intervencionista
empreendida pelo Governo.
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